O que pensamos ou sentimos quando falamos a palavra “gênero”?

de Radar ODS

ODS 5: Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas.

O RADAR ODS considera que, por detrás da palavra discriminação por gênero, há um conjunto de outras palavras, tais como, misoginia e todas as formas de homofobia incluindo transfobia, logo, acredita que, alcançar a igualdade de gênero como o ODS 5 enuncia vai muito além do necessário empoderamento de todas as mulheres e meninas.

Este post discute os diferentes sentidos que podem ser atribuídos a palavra gênero, suas repercussões no cotidiano social, incluindo as práticas de educação e de saúde, se propondo a contribuir para o debate que possibilite pensar diferentes estratégias que respondam ao ODS 5 e permitam ir além do seu próprio enunciado.

A palavra gênero vem ganhando distintos significados ao longo da nossa história recente. Usualmente ligado a luta das mulheres por direitos, vem se configurando de diferentes formas a partir dos distintos momentos e cenários em que se dão essas lutas, usualmente denominadas “ondas feministas”.

Em uma primeira leitura, gênero está diretamente conectado com sexo, mais precisamente com o sexo biológico. Assim o gênero é determinado por cromossomos sexuais e por um conjunto de hormônios que inundam os diferentes corpos humanos marcando distinções “anátomo-fisiológicas”. Para o feminismo da primeira onda, as diferenças existentes entre homens e mulheres são resultantes de fatores naturais.

A partir do chamado “feminismos de segunda onda”, marcado pelo surgimento dos “novos “movimentos sociais (que reivindicam a ideia de que as desigualdades estão marcadas não só por diferenças econômicas, mas também por diferentes identidades culturais), há uma separação entre gênero e sexo. O primeiro é social, ou seja, é determinado pelo conjunto de interações e experiências que os indivíduos agregam a partir de suas relações sociais. Já o sexo é apenas uma expressão da biologia.

Embora a noção de gênero como uma construção social ou significação cultural do sexo, tenha sido um avanço em relação ao determinismo biológico, e na compreensão de como nos significamos culturalmente como homens e mulheres, críticas são feitas ao fato de que, o construtivismo social de gênero de dá a partir de uma base pré-existente determinado pelo sexo biológico. (LANZ,2015).

A terceira onda do feminismo surge a partir dos anos 90 na esteira dos movimentos pós-coloniais e tendo como referência os autores do pós-estruturalismo francês. Nessa perspectiva tanto gênero quanto sexo, são considerados como meros discursos normativos, artifícios de linguagem que dão sustentação ao dispositivo binário de gênero. Aqui há uma crítica as narrativas usuais de gênero, consideradas apenas descritivas ao não conseguirem ir além do binarismo homem/mulher. Para uma das principais teóricas dessa linha, gênero não deve ser meramente concebido como a inscrição cultural de significado num sexo previamente dado, tem de designar também o aparato mesmo de produção mediante o qual os próprios sexos são estabelecidos. (SCOT, 1989; BUTLER, 2010)

Dessa forma, o papel do gênero seria produzir a falsa noção de estabilidade, em que a matriz heterossexual estaria assegurada por dois sexos fixos e coerentes, os quais se opõem como todas as oposições binárias do pensamento ocidental: macho x fêmea, homem x mulher, masculino x feminino, pênis x vagina etc. É todo um discurso que leva à manutenção da tal ordem compulsória.

Toda essa complexidade inscrita nas reflexões de gênero vem sendo progressivamente negligenciado nas escolas de ensino fundamental e médio. Silenciados nos currículos de formação das profissões de saúde. A organização dos serviços de saúde não estrutura o acesso considerando as singularidades das populações que expressam o gênero para além do binarismo homem/mulher. Os profissionais de saúde se sentem impotentes para enfrentar essas especificidades.

Se o ODS 5, visa alcançar a igualdade de gênero, ele assume a existência de desigualdades referidas a essa categoria, logo, irá formular estratégias que progressivamente tendem a reduzir essas iniquidades. A questão que aqui se coloca é: qual o tamanho dessas desigualdades e quem são os desiguais? Fica fácil compreender que o tamanho e as pessoas que estarão envolvidas nesse grupo desigual estará na dependência direta da perspectiva de gênero que será adotada. Se tomarmos uma visão mais naturalista, os excluídos serão as mulheres em geral, e algumas em particular. Por outro lado, se nos aproximarmos das visões construtivistas e do pós-estruturalismo, esse grupo se tornará ainda maior pois além das mulheres, gays, lésbicas e transgêneros irão compor o grupo.

Enfim, o que sentimos ou pensamos sobre gênero determina o tamanho dos excluídos e consequentemente as especificidades das estratégias que serão acionadas para diminuir o gradiente de exclusão.

No Brasil, em um contexto de políticas conservadores e um quadro de intolerância cada vez mais latente, a expressão da diferença, marcada por corpos não desejáveis ou corpos socialmente menos qualificados do que outros corpos, se vivencia um cotidiano de exclusão e violência. Nesse contexto, se trata de pensar as condições desumanizadoras que essas pessoas são colocadas e o silêncio e silenciamento que se faz em torno de suas existências.

Quando pensado em referência aos objetivos do milênio, os objetivos do desenvolvimento sustentável avançam ao incorporar um capítulo específico para as questões de gênero. Suas metas são inspiradoras quando pensamos as desigualdades traduzidas em oportunidades sociais diferenciadas e violência cotidiana a que as mulheres historicamente vêm sendo submetidas. Entretanto, o silêncio em torno das expressões de gênero que rompem os rígidos códigos instituídos pelos processos heteronormativos e do binômio masculino/feminino, é preocupante e reforçam o estigma e as diferentes manifestações sociais de homofobia e transfobia.

Nunca é demais lembrar o alerta e a necessidade expresso nos princípios dos direitos humanos referidos a gêneros e sexualidade. Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Todos os direitos humanos são universais, interdependentes, indivisíveis e inter-relacionados. A orientação sexual e a identidade de gênero são essenciais para a dignidade e humanidade de cada pessoa e não devem ser motivo de discriminação ou abuso. Entretanto, violações de direitos humanos que atingem pessoas por causa de sua orientação sexual ou identidade de gênero, real ou percebida, constituem um padrão global e consolidado, que causa sérias preocupações. (PRINCIPIOS DE YOGYAKARTA, 2006).

Diante do refletido acima, o RADAR ODS pergunta:

  • O que você pensa sobre a igualdade de gêneros?
  • Qual a tua percepção sobre a violência contra as mulheres?
  • Qual a tua percepção sobre a violência contra gays, lésbicas e transgêneros?
  • De que forma a educação e a saúde podem contribuir para aumentar a eficiência do ODS 5?
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